sábado, 26 de dezembro de 2020

Primer


 Este filme traz teorias da física de forma complexa e desafiadoramente compreensíveis. Este é o aviso de que ele é o filme mais difícil de entender que eu já ouvi falar, assista-o preparado para provavelmente não entender nada.
 Abe e Aaron são dois amigos engenheiros, que na tentativa de criar um dispositivo que diminua a massa aparente de objetos, acabam inventando acidentalmente uma máquina do tempo. Eles planejam meticulosamente tudo o que deve ser feito antes, durante e após as viagens para que não haja uma quebra paradoxal temporal. Ao contrário dos outros filmes de viagem no tempo, Primer não explica nenhum conceito, não tem uma edição que facilite nossa compreensão e provavelmente só foi feito como forma de desafio do diretor/roteirista/produtor/ator Shane Carruth para o resto do mundo.
 Quando eu assisti Primer pela primeira vez eu reiniciei o filme depois de meia hora assistindo-o e fui pegar caneta e papel. Depois de assistir umas 4 vezes consultando e adicionando anotações eu acredito que eu tenha entendido cerca 80% do filme. Primer só valerá a pena se você gostar de ficar se torturando psicologicamente para entender algo. Então se você, assim como eu, não pode ouvir alguém falando que não entendeu nada de algum filme que isso já desperta um interesse em assisti-lo, tenho certeza que Primer será um dos seus maiores desafios cinematográficos.

Destaque:
  • É óbvio que o destaque do filme é o roteiro. Eu fico pensando no grau da genial obsessão desse cara pra conseguir bolar toda essa história.
Diretor: Shane Carruth
Ano: 2004
País: Estados Unidos
Minha nota: 8/10

sábado, 28 de novembro de 2020

Minha irmã - L'enfant d'en Haut



 Atenção: Se você não gosta de filmes parados, não assista a este.
 Simon sobrevive através de furtos realizados em uma luxuosa estação de esqui. Ele mora com a irmã, que vive constantemente pulando de emprego em emprego e atualmente depende financeiramente de Simon, que com apenas 12 anos cumpre a função de mantenedor de sua casa.
 O filme se divide entre os dois grandes dramas da vida de Simon, o drama social, que o leva a praticar os constantes furtos, e o drama familiar, que inicialmente aparenta ser contido e até casual, até nós nos aprofundarmos em sua pequena e disfuncional família e descobrirmos que a vida de Simon é muito mais trágica do que aparenta. 
 As atuações dos ótimos Kacey Mottet Klain e Léa Seydoux são a base de apoio para essa comovente e bem escrita história, que certamente encontrou a direção perfeita nas mãos da Ursula Meier, diretora já acostumada a captar o drama e a melancolia através de silêncios, olhares e expressões de seus atores.

Direção: Ursula Meier
Ano: 2012
País: França
Minha nota: 8,5/10

domingo, 15 de novembro de 2020

As boas maneiras

 

 
Essa é mais uma ótima produção do gênero de horror/terror nacional, gênero esse que felizmente está se expandindo e conquistando aos poucos os ainda incrédulos cinéfilos repetidores da frase: Filme brasileiro não presta!
 Em As boas maneiras acompanhamos Clara (Isabél Zuaa), que começa a trabalhar de babá/enfermeira para a rica caipira Ana (Marjorie Estiano), que a contrata mesmo ainda estando grávida, para auxilia-la com a casa durante esse período de gravidez. Como Clara dorme no serviço ela começa a reparar que Ana tem estranhos hábitos noturnos, que vão se intensificando com o avançar da gestação.
 Esse é um daqueles filmes em que tudo e todos inicialmente parecem triviais, até que sutilmente percebemos que toda a normalidade dos personagens começa a criar um tom diferente, algo mais sinistro e surreal. E é no auge desse surrealismo, exatamente no meio do filme, que ocorre uma brusca passagem de tempo, isso é algo que normalmente me incomoda muito, mas em As boas maneiras isso não quebra o ritmo do filme. Quando começa a segunda parte do longa nós já sabemos a grande revelação do filme (que na verdade é obvia), mas isso não o deixa menos interessante e nem menos intrigante. 
 A ótima dupla de diretores Juliana Rojas e Marco Dutra conseguiram inserir tantos significados num suspense que mais parece fábula, que só entende literalmente quem já sentiu na pele o significado de "O mundo é diferente da ponte pra cá", inserção essa que só foi possível através do enorme auxilio dos belíssimos trabalhos de cenografia e fotografia, que construíram toda a parte visual para tornar esse conto atualmente crível.

Destaque:
  • Eu tenho ouvido muita gente falando que a Marjorie Estiano é uma das melhores atrizes brasileiras da atualidade, o que me causou muita curiosidade em assistir algum trabalho dela, e depois de As boas maneiras eu com certeza comecei a concordar com essas pessoas.
Direção: Juliana Rojas e Marco Dutra
Ano: 2017
País: Brasil
Minha nota: 8/10 


quinta-feira, 8 de outubro de 2020

Relíquia macabra - Relic

 

 Atenção: Este filme é extremamente simbológico, extremamente mesmo! Caso você não se interesse por filmes assim, este é o aviso para evitar uma possível decepção.
 Kay recebe uma ligação informando que sua mãe, Edna, que é idosa e mora sozinha, não foi vista pelos vizinhos nos últimos dias e está sendo considera como uma possível desaparecida. Kay e Sam, sua filha, resolvem ir até a casa de Edna para procurar algum indício que auxilie na sua busca e lá encontram uma casa completamente desarrumada, suja e com os alimentos já apodrecidos. Edna reaparece repentinamente em uma manhã, aparentemente sem se lembrar de nada do que ocorreu, o que só faz aumentar a preocupação de Kay e de Sam quanto a ela.
 O medo é algo muito intimo, o que nos causa medo é sempre algo muito pessoal, e Relic nos mostra medos muito reais simbolizados em níveis crescentes de tensão e horror, que só ampliam nossas reflexões negativas sobre o que já temíamos. 
 O filme possui cenas de horror que nos faz mergulhar em um clima claustrofóbico e foi chamado por muitos de o filme de terror do ano, mas não se deixe levar pela opinião alheia, como eu escrevi anteriormente, o medo é algo pessoal, então se você nunca refletiu profundamente sobre distanciamento familiar, problemas mentais, velhice e principalmente sobre o abandono, talvez Relic não te atinja com o mesmo impacto que atingiu a muitos.
 Obs: Sabe aquelas frases de bêbado ditas do nada e que causam uma epifania profunda? Que te fazem pensar: Porra mano, filosofei horrores agora!? Uma vez eu disse impensadamente durante uma conversa de bar: Envelhecer é a consequência de viver. Desde que eu assisti à esse filme eu tenho pensado muito mais nessa frase.
 Eu planejei colocar Relic aqui assim que eu o assisti, mas esta também foi uma sugestão da Raisa, que é uma frequentadora do blog, caso você tenha uma sugestão de algum filme que você não acha em lugar nenhum e que tenha uma história que fuja do comum, pode deixa-la nos comentários.

Destaques:
  • A direção da estreante Natalie Erika James fez toda a diferença ao longa. Todo o trabalho de construções de cenas são inegavelmente belíssimos.
  • A última cena, mano do céu, tive um colapso mental as duas vezes que assisti ao filme.
Direção: Natalie Erika James
País: Austrália
Ano: 2020
Minha nota: 9/10 

quinta-feira, 24 de setembro de 2020

Devorar - Swallow

 


 Se eu listasse os filmes que me fizeram refletir por dias, Devorar com certeza apareceria entre os 10 primeiros. Até agora é o melhor filme que eu assisti no ano de 2020, e eu duvido que eu veja algo mais surpreendente do que ele nesses últimos meses do ano. Eu acredito que quanto menos você souber sobre a sinopse melhor será a sua experiência ao assisti-lo, então eu darei uma breve descrição, que você não deveria ler se pretende assistir ao filme, mas se você é daqueles que precisa saber de que se trata para criar o interesse em vê-lo, eu tentarei ser o menos spoilerenta o possível.  
 Hunter se casou recentemente com um jovem executivo que trabalha na empresa do pai e lhe dá tudo o ela deseja, materialmente falando. Seus dias consistem em deixar tudo irritantemente impecável em casa, jogar joguinhos de celular, desenhar, ser constantemente ignorada pelo marido e sogro e acatar os conselhos conservadores da sogra. Após ficar grávida indesejavelmente (para ela pelo menos), Hunter desenvolve a Síndrome de Pica, que causa uma incontrolável vontade de comer objetos que não tem valores nutritivos e que, no caso de Hunter, são objetos perigosos, que colocam em risco sua vida.
 Toda a analogia que pode ser dada à palavra engolir (swallow) é utilizada nesse filme, Hunter não engole apenas objetos perigosos, ela engole tudo o que lhe é imposto, tudo que é imposto às pessoas pelas invisíveis "regras de como ser uma pessoa/casal/família exemplar". Toda a estética do filme foi criada para aparentar que a história se passa nos anos 50, quando o "american way of life" estava em alta, e que assim como no filme, as pessoas escondiam seus problemas embaixo de um consumismo escancarado.
 Devorar é de uma imensa sensibilidade e sutilidade, eu tenho certeza que a maioria das pessoas não irão adora-lo, já que ele consegue causar um desconforto em quase todas as cenas e é tão excêntrico quanto a síndrome de Hunter, mas se você gosta de filmes que te fazem ficar na merda, refletindo com cara de idiota durante dias, literalmente fazendo seu ego filosofar com seu ID, Devorar é altamente recomendado.

Destaque:
  • Mano, a atuação da Haley Bennett é impecável, ela equilibra o delicado e o destrutivo. Como eu não conheci essa atriz antes? Porque o mundo não conhece essa atriz? Atuação perfeita.
Direção: Carlo Mirabella-Davis
Ano: 2019
País: Estados Unidos
Minha nota: 9.5/10
 

sexta-feira, 18 de setembro de 2020

Nell


 Após a morte de uma eremita que vivia isolada em uma floresta, o médico Lovell (Liam Neeson) descobre que a esclusa senhora tem uma filha já adulta, chamada Nell (Jodie Foster), que aparentemente nunca saiu do terreno da propriedade em que vive, nunca teve contato com outras pessoas e fala um idioma incompreensível. Como a Nell se opõe as tentativas iniciais de contato, Lovell e a psicóloga
 Paula resolvem passar alguns meses a observando com a finalidade de compreenderem como seria o humano sem a influência de outras pessoas e da vida moderna.
 Apesar de alguns clichês Hollywoodianos, o filme levanta um ótimo questionamento sobre a vida em sociedade. O respeito à vontade do individuo ou a preservação de sua segurança? O quanto a sociedade pode interferir? 
 Nell não é um filme excepcional, mas ele tem uma história bem construída, traz uma excelente atuação da Jodie Foster (como sempre), e ele também aborda um dos assuntos que eu sempre adoro ver no cinema, a comunicação.

Direção: Michael Apted
Ano: 1994
País: Estados Unidos
Minha nota: 7,5/10


domingo, 6 de setembro de 2020

Mangue negro

 

 Rodrigo Aragão é um dos grandes nomes do terror brasileiro, um grande mestre dos efeitos visuais e que mesmo com baixíssimos orçamentos consegue fazer ótimos filmes de gênero. Eu resolvi postar Mangue negro agora para ajudar a divulgar o novo filme do diretor, O cemitério das almas perdidas, que será apresentado na abertura do Cine fantasy (dia 06/09), que esse ano será transmitido pelo Cine Belas Artes drive-in. Mas se você não mora próximo à capital paulista, ou se não possui veículo, o Belas artes também irá transmitir o festival pelo Belas artes à la carte, que é o serviço de Streaming do cinema. Ele ficará disponível somente na noite do dia 07/09, e a mensalidade é de apenas R$9,90, menos que uma meia entrada no cinema e você ainda dá uma força ao terror nacional.
 Numa remota aldeia perdida em meio à manguezais vive uma pequena comunidade de pescadores, o que eles desconhecem é que com a morte do mangue, devido ao excesso de caça e por ter virado um depósito de lixo, toda a vida nele também irá morrer gradualmente, e quem se alimentar dos animais restantes do local será contaminado por uma espécie de vírus, que os transforma em mortos-vivos.
 Mangue negro é repleto de sangue e tripas (principalmente nas ultimas cenas), também tem algumas tiradas cômicas que funcionam bem, mas se você não é acostumado a esse tipo de filme é preferível você não assisti-lo comendo. Para mim, o único defeito do longa é o excesso de protagonismo da Dona Benedita, o que quebra um pouco o ritmo do filme mas não o prejudica por inteiro.
 Os cenários são maravilhosamente bem escolhidos, o mangue e suas cabanas de madeira dão todo um ar interiorano ao filme, e tem também a trilha sonora que vai de metal a Orquestra sinfônica do Espirito Santo.
  
Destaque:
  • Os efeitos especiais e a maquiagem (feitos pelo próprio Aragão) são ótimos, não perdem em nada para os terrores gringos. 
Direção: Rodrigo Aragão
Ano: 2008
País: Brasil
Nota: 7/10

quinta-feira, 27 de agosto de 2020

Tucker e Dale contra o mal - Tucker & Dale vs Evil

 

 Eu percebi que a minhas últimas postagens foram muito sombrias e resolvi postar uma comédia de terror, ou como dizemos popularmente, um thrash. Se você não conhece o termo, tente lembrar de Elvira - A rainha das trevas, que passava constantemente na sessão da tarde nos anos 90. Mas se você não cresceu nos anos 90, imagine As branquelas dentro dos Jogos mortais... o resultado seria um filme thrash.  
 Tucker e Dale são dois estereotipados caipiras, que acabaram de comprar uma cabana na floresta para passarem suas férias. Os seus planos de beber e pescar durante todo o verão são interrompidos quando um grupo de universitários (também extremamente estereotipados), que estão acampando em um local próximo dali, os confundem com assassinos em série e resolvem enfrenta-los, causando o mais improvável e hilário resultado possível.
 Assista sem pretensões, apenas para dar risada ou para melhorar seu animo e sua visão da existência humana depois de assistir alguns dos desgraçamentos mentais (como diria a maravilhosa Redatora de merda) aqui do blog.

Direção: Eli Craig
Ano: 2010
País: Canadá
Minha nota: 7.5/10

 

segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Luz depois das trevas - Post tenebras lux


   Nesse amontoado de lembranças, sonhos e fantasias que é Luz depois as trevas, vemos a história da família mexicana de classe média alta, formada por Juan, Natália e seus filhos Eleazar e Rut. Ao que parece, a família se mudou a pouco tempo para uma área rural e eles ainda estão se adaptando à esse novo ambiente e aos seus habitantes.
 Linearidade e lógica são coisas inexistentes neste filme, então se for assisti-lo eu tenho certeza que sua experiência será melhor se você apenas observar essas belíssimas cenas extremamente bem dirigidas (que parecem o teste de alguém que acabou de comprar uma câmera nova e esta alterando de foco centralizado para desfocado), do que se você ficar procurando por explicações. Eu entendi cem por cento do filme? Não, mas neste filme isso definitivamente não tem relevância. Depois das primeiras cenas, que para mim foram as mais confusas, nós nos acostumamos com o ambiente que hora é pesadelo, hora é sonho destorcido, e começamos a ser absorvidos por essa atmosfera surreal que foi detalhadamente construída e sustentada em cada cena.
 Ganhador do prêmio de melhor diretor no festival de Cannes.
 Este filme foi pedido por um frequentador do blog. Caso tenha um filme que você não encontre em lugar nenhum e que tenha uma história que fuja do comum, pode deixar sua sugestão nos comentários.

Destaque:                              
  • Destaque para a cena em que a Natália toca e canta It's a dream, do Neil Young. Eu sempre acho que certos filmes tem tudo a ver com alguma música, mas Luz após as trevas parece até inspirado em It's a dream.

Direção: Carlos Reygadas
Ano: 2012
País: México
Minha nota: 8/10


domingo, 2 de agosto de 2020

Além do arco iris negro - Beyond the black rainbow


  No futuro, em um laboratório que realiza bizarras pesquisas experimentais vive a jovem cobaia Elena, que farta de sua monótona rotina arrisca-se em um ousado plano de fuga, que colocará não só a sua vida em risco.
 Além do arco-íris negro é um filme difícil em vários aspectos, difícil de compreender, difícil de não se incomodar e também é bem difícil de manter-se concentrado durante todo o filme. Eu não digo isso como uma crítica, o que ocorre em Além do arco íris negro é que a intensidade dos sons são tão fortes que chegam a causar agonia (em uma cena eu cheguei muito perto da horrorosa sensação de enxaqueca), o que me desconcentrou do filme em alguns momentos. Tentem imaginar o Freddy Krueger arranhando uma lousa... é essa a sensação.  Ele é instigante em muitos aspectos, principalmente tecnicamente, onde vemos que diversas técnicas se juntam para criar um ambiente extrassensorial, o que combinou muito com a temática do filme.  
 O que eu ouvi sobre esse filme é que ele é vazio, que poderia ter um roteiro mais bem trabalhado, mas eu penso exatamente o contrário. Obviamente o diretor, Panos Cosmatos, queria criar uma obra extrassensorial e não contar uma história detalhadamente bem elaborada. O Cosmatos parece ser um diretor que chegou investindo em obras com violência psicodélica, uma categoria que eu acredito que não tenha nome, então achei que esse é o nome que melhor a descreve, o que é interessante pela falta de filmes com a mesma temática, alias, vale muito a pena conferir seu segundo filme, o irreverente Mandy.
  Obs: A grande maioria das pessoas não gostaram desse filme, pelo que eu percebi, pela grande quantidade de cenas paradas e porque, de acordo com elas, a história é fraca. Na verdade existe uma história bem interessante, mas ela fica beeeeem escondidas nas entrelinhas e são dadas poucas dicas durante o filme onde podemos percebe-la. De qualquer modo fica o aviso: Se você não gosta de filmes parados, não assista a esse.
 Esse filme foi a sugestão de um frequentador do blog, então se você tem uma sugestão de um filme com uma temática diferente do habitual e que você não acha em lugar nenhum, pode deixar aqui nos comentários.

Direção: Panos Cosmatos
Ano: 2011
País: Canadá 
Minha nota: 7.5/10

quarta-feira, 22 de julho de 2020

Fome de viver - The hunger


 Imortais que precisam de sangue para sobreviver. Em Fome de viver o termo vampiro e todos estereótipos a eles relacionados são esquecidos, o que o filme apresenta são inusitados seres elegantes e estilosos da alta sociedade de Nova York dos anos 80.
 Miriam (Catherine Deneuve) e seu amante John (David Bowie), se não fosse pelo fato de caçarem humanos em casas noturnas e prostíbulos para se alimentarem de seu sangue, poderiam parecer um apaixonado e sexy casal burgues, que vive tranquilamente em sua refinada mansão. A tranquilidade do casal é afetada quando John, repentinamente, começa a envelhecer de forma extremamente rápida. Os dois, separadamente e sem o conhecimento do outro, procuram a cientista especialista em envelhecimento acelerado Sarah (Susan Sarandon), que afirma que o envelhecimento é uma doença, o que Sarah desconhece é que a cura está a seu alcance de uma forma que ela jamais imaginou.
 Toda a originalidade desse cultuado filme é um conjunto de vários componentes que foram utilizados na medida certa, criando um visual surpreendentemente único. Uma fotografia cheia de sombras e meia luz, cortes rápidos nas cenas de violência gráfica, a semelhança da montagem de videoclipe e toda a poesia visual gótica fez esse filme ser o preferido de 9 a cada 10 fãs de Bauhaus.
 Infelizmente a maioria das pessoas só lembram de Fome de viver pela cena de sexo da Catherine Deneuve com a Susan Sarandon, mas o filme vai muito além disso. Antes de dirigir clichês de Hollywood, Tony Scott fez essa obra singular, que esbanja originalidade em meio a um trio de atores que por si só já valeria a minha atenção.

Direção: Tony Scott
Ano: 1983
País: Inglaterra
Minha nota: 8.5/10



segunda-feira, 6 de julho de 2020

A menina que morava do outro lado da rua - The girl who lives down the lane


 A adolescente Rynn (Jodie Foster) e seu pai se mudaram da Inglaterra para uma pequena cidade canadense há poucos meses mas já despertam o interesse dos habitantes locais por suas excessivas discrições. Rynn estuda em casa e raramente é vista na cidade, já seu pai, que é poeta, passa os dias em seu escritório e nunca é visto por ninguém. Os residentes ainda desconhecem o fato de que Rynn esconde um terrível segredo, no entanto quanto mais dias passam, maior e mais difícil fica esconde-lo de todos.
 A menina que morava do outro lado da rua expõe temas como pedofilia, emancipação e sexo diante de uma personagem de 13 anos, o que certamente o tornaria dificílimo de ser produzido em dias atuais (mas quem lembra da Jodie Foster em Taxi driver sabe que os anos 70 eram cinegraficamente muito pesados), porém são esses fatos que o tornam interessante, pois diante deles conseguimos ver que a vida de Rynn não seguiu o caminho que ela e seu pai planejaram, e como Rynn contornará essas adversidades são o tema central do filme.  
 Eu sempre digo que alguns filmes poderiam ter menos tempo de duração mas esse é um dos poucos casos que ocorre o contrário, o filme poderia ter pelo menos 15 minutos a mais, ele apresenta um bom desenvolvimento de todos os personagens mas eu fiquei com a impressão de que eles poderiam nos apresentar um pouco mais de sua personalidade.

Destaque:

  • As atuações da Jodie Foster, com 13 anos na época, e do Martin Sheen são excelentes.

Direção: Nicolas Gessner
País: Canadá
Ano: 1976
Minha nota: 8.5/10

sexta-feira, 12 de junho de 2020

Inocência - Innocence

  

 Em um internato para meninas, que fica no meio de uma floresta isolada, as novatas chegam ao local em caixões e são recepcionadas pelas meninas de sua nova casa. Iris, a recém chegada, logo percebe que naquele lugar aparentemente perfeito existem excessivas regras e horários para tudo. Cada menina tem uma fita de cabelo de cor diferente, cada cor representa uma idade específica e também uma função diferente. Ela também percebe que Bianca, a garota mais velha de sua casa, sai todas as noites, um pouco antes das outras irem dormir, e quando elas acordam ela está de volta. O quanto respeitamos as regras quando queremos desvendar um mistério?
 A questão de Inocência é a obediência, essa é a palavra central do filme. Vemos uma pequena sociedade feminina sendo "domesticada", sendo ensinada a obedecer sem saber o porquê. Aqui temos uma visão do micro representado o macro de uma forma clara e muito bem montada.
 O filme tem inúmeras metáforas e muito lirismo, elementos que pra mim só o deixam mais interessante, mas imagino que muitas pessoas o achem cansativo por conta disso.
 Inocência me foi indicado pelo Breno, que é um frequentador do blog. Se tiverem mais indicações que, assim como essa, sejam de filmes que você não acha online em lugar nenhum, e que também tenham uma história que fuja do comum, por favor, deixem a sugestão nos comentários.

Destaque:
  • Eu nunca tinha assistido à um filme da Lucile Hadzihalilovic e foi uma experiência extremamente surpreendente. A direção se entrelaça perfeitamente com a fotografia criando uma atmosfera que sustenta todo o lirismo e o clima onírico do filme.

Direção: Lucile Hadzihalilovic
País: França
Ano: 2004
Minha nota: 9/10

quinta-feira, 21 de maio de 2020

Estômago


 Raimundo Nonato chega a São Paulo sem dinheiro, moradia ou um planejamento do que realmente deseja e logo arruma um trabalho em um bar na região central da cidade. Lá ele descobre que tem talento para ser cozinheiro, e isso chama a atenção dos frequentadores do bar e de donos de restaurantes locais, causando uma rápida ascensão em sua carreira. Paralelamente, também vemos a ascensão de Raimundo Nonato como cozinheiro em um lugar bem diferente da capital paulista, a prisão, onde ele é obrigado a usar uma extrema criatividade para criar pratos que agradem os nada agradecidos presidiários.
  A dinamicidade do roteiro e da edição, que conseguem equilibrar perfeitamente as duas linhas temporais, transformaram Estômago em um dos melhores filmes nacionais já feitos. Esse é um daqueles filmes que, não importa quanto tempo passe, nós nunca esquecemos de sua história. É sempre minha indicação quando me pedem sugestões de filmes nacionais, mas esse não é um filme para todo mundo, porque o título pode ser metafórico (assim como o filme), mas realmente é preciso ter estômago forte para assisti-lo.

Destaque:
  • O elenco é impecável. Os coadjuvantes são excelentes, mas os protagonistas, João Miguel e Fabíula Nascimento, dão um show a parte.
Direção: Marcos Jorge
Ano: 2007
País: Brasil
Minha nota: 9.5/10

sábado, 2 de maio de 2020

Cria corvos - Cria cuervos


 Sabe aqueles filmes protagonizados por crianças sorridentes, de camisetas listradas, que andam de bicicleta com os amigos durante o verão e que te faz ficar com saudade da sua infância? Esse, definitivamente, não  é o tipo de infância que Ana, a protagonista de Cria Cuervos, teve. Ana, devido a fatos que se coincidiram com seus desejos, acredita que tem o poder de dar a vida e a morte as pessoas,  e ela tentará usar esse suposto dom para acabar com toda a opressão imposta à ela pelos tiranos adultos.
 Ana, acredito eu que como forma de refúgio mental, relembra, recria e imagina acontecimentos que deixaram fortes lembranças e pensamentos que a assombravam. Isso causa, em nós e em Ana, uma certa dúvida se aquilo ocorreu de fato, ou se ocorreu apenas em sua imaginação.
 Cria cuervos utiliza a revolta de Ana com a autoridade como metáfora para a revolta da população com a ditadura Franquista. Ana era obrigada a viver nos limites que lhe eram delimitados, tinha que seguir as regras que lhe eram impostas sem saber o motivo de ter que segui-las. Todas essas normas causam em Ana uma aversão por qualquer espécie de autoritarismo, e causam-lhe os piores pensamentos e desejos a quem lhe tente dar ordens.
  Para mim a Ana parece um exemplo dado por Freud de tudo que pode ocorrer durante a infância que irá influenciar negativamente na personalidade de uma pessoa, ou seja, Ana parece uma criança normal. Ela tem suas mágoas, seus momentos de egoísmo, seus desejos vingativos, mas também tem seus momentos de brincadeiras e suas curiosidades infantis. 
 Cria cuervos y te sacarán los ojos (cria corvos e eles te arrancarão os olhos) é o ditado popular de onde foi tirado o título do filme, e nesse caso nós compreendemos que inocência infantil são palavras que nem sempre andam lado a lado.
 Obs: Eu sempre costumo avisar quando o filme é parado, pois sei que muitos não gostam, então fica o aviso. O filme é muito intimista, a maior parte do tempo ele mostra apenas as expressões de Ana e tem várias sequências sem ou com poucas falas. O que eu sempre digo é: saia da sua zona de conforto e arrisque uma coisa nova, mas obviamente isso fica a seu critério.

Destaque:

  •  A impressionante interpretação de Ana Torrent, que na época tinha apenas 9 anos, é uma das mais complexas interpretações infantis que eu vi no cinema.

Direção: Carlos Saura
Ano: 1976
País: Espanha
Minha nota: 8.5/10

domingo, 12 de abril de 2020

Phenomena





 Dario Argento, tentando seguir a moda dos slashers americanos oitentistas, escreveu, produziu e dirigiu Phenomena, que mesmo com possivelmente o enredo mais utilizado nos filmes de terror dos anos 70 e 80 (seriall killer de adolescentes), deixa em evidência a extrema originalidade de Argento, que nunca fez um filme que não seja no mínimo esquisito pra caralho.
 Jennifer (Jennifer Connely) é uma adolescente americana que vai estudar em uma escola para meninas na Suíça. Logo após sua chegada ela é informada pela colega de quarto, uma estereotipada francesa, que há um assassino de garotas que assombra aquela região. Jennifer, que é sonâmbula, é ajudada após um de seus passeios sonâmbulos noturnos, por um famoso entomologista, que nota que a garota tem uma telepática ligação com insetos e que isso pode auxiliar muito na sua investigação para descobrir quem é o assassino.
 Um giallo com toques de slasher e de conto de fadas, que como quase todos os outros giallos que eu já vi tem problemas de narrativa e péssimas atuações dos coadjuvantes, mas que compensa esses fatos com uma extremamente bem construída atmosfera sombria e uma belíssima direção de arte. 
  Argento adora apresentar contrastes extremos em suas obras e em Phenomena ele utilizou inumeráveis insetos e vermes, que são completamente adversos a beleza hipnotizante da protagonista. As opiniões sobre esse filme também costumam contrastar bastante, eu gosto de filmes com uma narrativa precisa e sem pontas soltas, mas gosto mais ainda de filmes sensitivos, onde somos absorvidos por uma sinistra atmosfera sobrenatural, e para mim não existe diretor melhor em conseguir tal feito como o mestre do terror Dario Argento.
 Obs: Eu realmente gostaria de saber porque o Argento gosta tanto de quebrar janelas.
 Obs2: Se você não tem estômago forte é melhor evitar este filme. As cenas finais são de fazer até os mais carniceiros cinéfilos ficarem com o estômago embrulhado.

Direção: Dario Argento
País: Itália
Ano: 1985
Minha nota: 7,5/10

quarta-feira, 1 de abril de 2020

O desprezo - Le Mépris





 Considerados por alguns o maior diretor da história do cinema (e por muitos o diretor dos filmes mais chatos), Jean-Luc Godard, em um de seus melhores filmes, nos conta a história de como uma simples atitude pode nos fazer criar o sentimento mais duro e irremediável de todos, o desprezo.
 No filme vemos que o famosíssimo diretor Fritz Lang, que interpreta ele mesmo, está dirigindo um filme que conta a história de A odisseia, mas um produtor americano, preocupado com a lucratividade do filme, contrata o roteirista Paul, e lhe dá a tarefa de deixar o filme menos artístico e mais comercial. O arrogante produtor americano interessa-se instantaneamente por Camille, a esposa de Paul, e a atitude de Paul referente a esse interesse causa em Camille o mais profundo e intenso desprezo. 
 Esse é o filme mais facilmente compreensível do diretor mais incompreendido da história do cinema. O desprezo tem uma narrativa com várias metáforas mas a linearidade que ele apresenta é algo raro nos filmes do Godard. Os filmes do Godard foram o meu primeiro contato com filmes franceses e para mim foi extraordinária a ideia das metáforas, metalinguagem, dualidades e falta de linearidade, pareceu-me que tudo era possível no cinema. Eu fui tirada da zona de conforto de filmes americanos com explicações mastigadas e fui jogada em um labirinto de epifanias francesas. Eu compreendo que existam pessoas que gostam de filmes lineares, finais explicados e narrativa realistas, mas se você for uma dessas pessoas e quiser sair um pouco do seu lado do espelho(ou se você pretende assistir a um filme do Godard por conta da música Eduardo e Monica), esse é o melhor filme para começar a desbravar essa experiência extrassensorial que é o cinema francês.
 Obs: Se você nunca ouviu falar do Fritz Lang pelo amor de deus vá assistir Metrópoles, que é com absoluta certeza um dos 10 melhores filmes já feitos.
 Direção: Jean-Luc Godard
 Países: França e Itália
 Ano: 1963
 Minha nota: 9/10

    

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

Pi


 Em seu primeiro filme, o diretor Darren Aronofsky já apresentava uma certa tendência a roteiros surreais, com ideias tão originais e inimagináveis que acabaram se tornando sua marca registrada.
 Pi conta a história de Max, um gênio da matemática que busca descobrir a numeração completa do pi e consequentemente começa a ser perseguido por acionistas e religiosos, que acreditam, cada um a seu modo, que a transcodificação desse número representa um padrão que tratá de certa forma poder ilimitado a quem o possuir.
 Quem já assistiu a outros filmes do Aronofsky, como os excelentes Mãe (2017) e Cisne negro (2010), sabe que a ambiguidade da narrativa é algo comumente utilizado em seus filmes e Pi segue por esse mesmo caminho. O apartamento de Max parece ser a forma metamorfoseada de sua mente, que de tão abarrotada de números e instrumentos de pesquisa, mal possui lugar para caminhar ou fazer qualquer outro tipo de atividade. O que "todos" sabemos é que a ideologia por trás de pi é muito parecida com a sequência de Fibonacci, a ideia de que tudo é matemática e que o pi é a perfeição em meio ao caos, mas o que acontece no filme é muito parecido com o mundo moderno. Enquanto o mundo busca poder, Max busca conhecimento e satisfação pessoal, mas o sistema societário sempre anda a procura de como corromper ideais pessoais em projetos financeiramente ambiciosos, o que trará à Max transtornos maiores dos que ele já enfrenta.
 Obs: Se você não entende nada sobre as teorias do pi e de Fibonacci imagino que a compreensão da história do filme seja um pouco mais complicada, sendo que mesmo pra quem conhece as teorias a história não é fácil, mas o filme vale o esforço da provável dificuldade de compreensão que ele causará.

Direção: Darren Aronofsky
Ano: 1998
País: Estados Unidos
Minha nota: 8/10


domingo, 12 de janeiro de 2020

O orador - O le tulafele



 É uma produção simples, com uma história crível e cativante, que se fosse feita em outro país provavelmente seria um filme dispensável, mas o que torna O orador atrativo é o fato dele ser de Samoa, pois no filme vemos os costumes inimagináveis dos samoanos, que vão desde como eles tomam banho até o modo de escolha dos chefes locais. 
 Saili é ridicularizado por muitos de sua vila por ser anão. Ele é casado com Vaaiga, que foi banida de sua vila de nascimento e que tem uma filha já adolescente, que foi criada por Saili mas que não é sua filha biológica. Dezessete anos depois de ser banida o irmão de Vaaiga vai até sua casa e pede para que ela regresse à sua vila de origem, pois só assim será possível que uma maldição imposta à ele seja quebrada. Além disso uma outra tragédia ocorre à Saili e ele terá que reunir toda sua coragem para conseguir manter sua família unida.
  Este é o primeiro filme feito totalmente na Samoa, e é interessantíssimo poder conhecer tradições e rituais de um lugar que eu sequer sabia que existia antes de assistir O orador. Dentre esses rituais é impossível não se impressionar com um chamado ifoga, onde a(s) pessoa(s) que te fez algum tipo de mal deve se sentar na frente da casa da pessoa ofendida, coberto com uma espécie de tapete de palha até que a pessoa saia e tire o tapete de você, mostrando assim que você está perdoado. Além da belíssima Samoa o filme também tem uma ótima história que junta costumes, perdão e coragem, e que mostra que temos que engolir nosso orgulho antes que o tempo invisível da vida se acabe e tenhamos que permanecer com as mágoas travadas em nossa garganta.

Destaque:

  • A trilha sonora é composta basicamente por "barulhos da floresta", ouvimos grilos, pássaros e o som do rio que nos emerge na maravilhosa atmosfera do filme.
Direção: Tusi Samasese
Ano: 2011
País: Samoa
Minha nota: 8/10

terça-feira, 7 de janeiro de 2020

Os infelizes - De helaasheid der dingen



 Os filmes do Felix Van Groeningen tem sempre um toque bem característico, uma espécie de tristeza irônica, uma melancolia cômica, que nos faz sempre tentar procurar um vestígio de esperança dentro de suas desoladoras histórias.
 Gunther narra a história em primeira pessoa, que se passa maioritariamente aos seus 13 e 27 anos, e o tema central de Gunther é a sua despudorada família. Aos 13 anos notamos que Gunther observa já acostumado a rotina de bares, concurso de bebidas, brigas e ressacas de seu pai e tios. Ele vive em meio a bagunça, a pobreza e (por incrível que pareça) ao amor e a união de seus parentes, o que faz com que o adolescente, mesmo vivendo em condições totalmente inapropriadas para ele, goste e sinta orgulho de sua família, mas ele percebe que aos poucos está se tornado mais um boêmio e toma uma decisão para tentar mudar o curso, que aparentemente já estava determinado, de seu futuro.
 Aos 27 anos vemos que Gunther permanece infeliz, ele não seguiu os passos de seu pai e tios em nenhum aspecto, nem na vida irresponsável que levavam e nem na felicidade que sempre demonstravam.
 Assim como Alabama Monroe, outro filme do Van Groeningen que eu já postei aqui no Nostromo, Os infelizes é narrado em duas linhas temporais diferentes, uma demonstra as causas e a outra o resultado, e como a narração é feita de forma intercalada nós percebemos desde o começo do filme que o mais esperado não ocorreu e que o acaso pode nos surpreender muito mais do que imaginamos.

Direção: Felix Van Groeninger
Ano: 2009
País: Bélgica
Minha nota: 8/10